quarta-feira, fevereiro 02, 2005

Don Antonio Machado sentado no estertor da luz

a poeira cai na sala familiar e a claridade do rio
entra pela janela transformando-se em poema

ao pousar no imenso cemitério de papel
a mão lavra a paisagem da memória erguida
da escura noite com suas florestas de sonhos
de resinas e de orvalhos

depois
tudo silencia a pouco e pouco os animais
as sílabas as terras o sofrimento dos homens
os dias só esperados onde me debruço
para a saudade do amado rosto

ofereço-te hoje a vida desta cansada mão
único tesouro que tremula no voo da ave
incendiada à roda da negra cabeça e o vento
dispersa num pranto rouco pelos campos de sória
o triste canto do rouxinol

ao longe don antonio adormece
num ermo de luminosa água e tempo frio

Al Berto, O Medo, Assírio & Alvim.

2 Comments:

Blogger Sérgio Lavos said...

O projecto wordsong é interessante, apesar de retirar gravidade aos poemas do Al Berto, transforma as palavras em coisas lúdicas, brinca com elas. Não sei se o Al Berto iria gostar, mas penso que ele não descartava a ironia da sua obra literária. Isto é, não se levava demasiado a sério. Mas, de qualquer modo, isso agora é irrevelevante. O Jorge Palma, que também é um excelente poeta (embora ele não o saiba) pegou no poema de outra maneira; também gostei do resultado final.

1:06 da manhã  
Blogger Lídia Aparício said...

E gostei muito de ter sido o Jorge Palma a pegar num
poema do Al Berto.

4:12 da tarde  

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